Crítica – Lilo & Stitch
A Disney tem insistido em transformar suas clássicas animações em live-actions, quase como quem tenta repetir uma receita esquecendo que o segredo estava na verdade no tempero, não na embalagem. Para cada O Rei Leão digitalmente vazio, temos um A Bela e a Fera que surpreende e abraça a audiência. E em meio a esse laboratório que mistura nostalgia e lucro, chega Lilo & Stitch: uma adaptação que, contra todas as probabilidades — e apesar de mudanças profundas no enredo — preserva com maestria os momentos emocionantes e o humor escrachado da produção original. Um feito raro. Um daqueles lampejos de que, sim, ainda existe alguma magia por lá.
Na história, conhecemos Lilo (Maia Kealoha), uma garotinha órfã e excêntrica que vive com sua irmã adolescente, Nani (Sydney Agudong), que tenta equilibrar trabalho e as responsabilidades de uma maturidade forçada pela tragédia. A vida das duas vira de cabeça para baixo quando Lilo adota Stitch (voz de Chris Sanders), uma criatura alienígena geneticamente modificada, confundida com um cãozinho. O que poderia ser um desastre intergaláctico se transforma em uma jornada sobre família, pertencimento e, claro, destruição em pequena escala e cheia de carisma.
É preciso deixar uma coisa clara logo de início: Lilo & Stitch não apenas funciona, como funciona melhor do que se esperava — e isso não é pouco, considerando o histórico recente da Disney. Toda mudança na narrativa é bem-vinda, afinal, é preciso lembrar que este é um filme feito para uma nova geração de crianças, e não um relicário intocável para adultos nostálgicos.

As atualizações de roteiro, especialmente na construção da relação entre Nani e Lilo, trazem mais profundidade sem cair em um melodrama barato. Nani ganha camadas além do arquétipo de irmã durona: há frustração, renúncia, empatia. A inclusão da assistente social Kekoa (vivida por Tia Carrere, a voz original de Nani) também ajuda a humanizar os conflitos adultos sem torná-los vilanescos.
Maia Kealoha é uma revelação. Ela personifica Lilo com a dose exata de teimosia e ternura, sendo convincente tanto nos momentos cômicos quanto naqueles em que a solidão escorre pelos olhos.
O roteiro, assinado por Chris Kekaniokalani Bright e Mike Van Waes, encontra tempo para humor, drama e até reflexões sobre identidade e pertencimento. O vínculo entre Lilo e Stitch é construído com mais sutileza do que o habitual, e o resultado é um final que emociona sem precisar implorar pelas lágrimas do público.
Mas nem tudo são ondas suaves na costa havaiana. O núcleo alienígena, que já era excêntrico no original, aqui sofre com uma estranha falta de energia. Até em momentos de humor é difícil criar uma conexão sincera. Além disso, os efeitos especiais que funcionam tão bem com Stitch parecem perder o charme ao tentar dar vida a outras criaturas do universo intergaláctico.
No fim, Lilo & Stitch (2025) é uma agradável surpresa. Ainda que peque em alguns pontos periféricos, a alma do filme permanece intacta — e mais do que isso, ganha novo fôlego. A emoção está lá, o humor também, e a mensagem sobre família continua ressoando com força: “ohana” significa família, e família significa nunca abandonar.